sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Caos, cocô e tetê

Acordo no susto habitual de todos os dias. Chora um, chora o outro. Levanto meio desnorteada pelos sonhos sem sentido de uma madrugada que não dormi direito, e vou direto pro quarto deles. Um erro de planejamento me faz perder o tempo pra um xixi matinal. Eles me viram.

A primeira parte da cena que consigo visualizar é um amontoado de lençol, cobertor, calça e fralda no chão entre os dois berços. Francisco apontava energicamente para o irmão. Quando adentro mais o recinto, percebo que ele delatava o crime. Joaquim tinha acordado com cocô e resolveu tirar tudo que tinha em sua cama e jogar no chão. Não contente com a sua rebeldia, decidiu também tirar sua fralda que por ironia do destino, caiu com o lado recheado no chão.

Não era uma situação desconhecida, eu sabia que a primeira coisa que deveria fazer era jogá-lo rápido na banheira e levar o "tetê" pra acalmar os nervos da galerinha. Então, eu coloquei-o no trocador para tirar sua roupa. enquanto cantava qualquer coisa da Galinha Pintadinha para acalmar o irmão que se esgoelava-se pelo seu tetê. Numa virada de cabeça pra entoar o refrão da música com o Francisco, o outro passa a mão suja com vontade na parede.

Se alguém entrasse naquele momento no quarto não saberia se sentava comigo pra chorar ou pra rir. Mas beleza, levo o pelado pra tomar banho, depois coloco no mesmo berço com o irmão (porque seu berço estava inabitável) e levo as sagradas mamadeiras. Por cinco minutos, é paz e silêncio. Me lembro de fazer xixi e aproveito pra encarar o lençol no tanque.

Terminado o lençol, escuto aquele choro, aquele que diz que algo de errado realmente aconteceu. Volto no quarto pra apartar a briga e pergunto com cara de louca o que aconteceu aqui. Joaquim me olha com cara de quem não sabe de nada e Francisco é só lágrimas e bracinhos. Joaquim ataca novamente, pensei. Procuro as marcas de mordida e encontro uma assustadora, então dou uma bronca nele e por algum motivo (talvez pela falta de controle na palavra) os dois dão gargalhadas. Mas antes de você ficar com dó de mim, lembre-se que se eu tenho duas criaturas com a mesma idade e vontades ao mesmo tempo, eles têm só uma mãe para compartilhar em todos os momentos.

Entre muitos "não" e "Óhh" sem sucesso, o dia vira noite. E o problema da fralda volta a me assombrar. Então, começo a maratona para coloca-los para dormir. Dou banho, saio mais molhada que eles, tento seca-los enquanto eles imitam aqueles frangos girando no açougue. Canto todas as músicas já inventadas para crianças, brinco de UFC para conseguir passar o cotonete nas orelhas e finalizo com a mamadeira até o topo.

Penso vitória e me jogo no sofá. Veja, a vitória para pais consiste em fazer as crianças dormir e conseguir terminar de ver um filme por inteiro. Sem academia, sem madrugada no Netflix, sem happy hour, sem livros e sem entender a maioria das piadinhas que estão rolando no facebook.

Coloco qualquer comédia romântica pra não ter que pensar muito antes de dormir, e pauso o filme pra ouvir a conversa dos dois, muito eloquente como sempre:
- Tato!
- Mamain...
- Apapá!
- Óhh... (num tom muito parecido com o meu)

Até aí tudo normal, o problema é quando o silêncio reina, sempre surge a dúvida: estão dormindo ou aprontando alguma? Mas o filme tinha chegado ao seu climáx, mesmo sabendo como ia ser o final da história, não quis levantar para saber o que estava acontecendo. Não precisou.

O mistério veio correndo, pelado e rindo muito da sua liberdade conquistada do berço. Era Joaquim, conseguiu escapar da sua cama, mas antes tirou toda a sua roupa e fez xixi no canto do quarto.

Não adiantava mais falar alto, pedir pelo amor de deus, rezar Ave Maria, fazer pirueta ou falar com a voz do Pato Donald. Então tive um insight, resgatei da mente uma conversa com a minha mãe que  me indicou um vídeo de uma palestra de um educador infantil.

Psicanalista, especializado em terapia infantil, intelectual, fã de música clássica e sem filhos no currículo. Achei um pouco suspeito, mas dei uma chance para palestra tão bem falada. Ele começava dizendo que crianças devem ser educadas de forma direta:
- Criança não quer compreender se é hora do banho, se é legal tomar banho, se o patinho de borracha vai estar lá pra brincar, etc. Então, você não deve tentar persuadi-lo a tomar banho, deve dizer simplesmente que está na hora de tomar banho.

Meu marido olhava o vídeo com  uma cara mista, fazia expressões dignas de cachorro quando inclina a cabeça. Até que o palestrante responde uma pergunta do público:
- Sim, eu e minha mulher decidimos não ter filhos, para nos dedicarmos ao trabalho.

Algo como, sei tanto sobre crianças que resolvi não tê-las. Oras, mas crianças não são para desistentes. Crianças são pra brasileiros que não desistem nunca, são para quem fica de quatro (literalmente) pra eles montarem, são para pessoas que não tem medo do ridículo, para quem imita o filho e se joga junto no chão do supermercado, crianças são para quem não tem medo de identificar no rosto o coco ou o chocolate, mas principalmente, crianças são para quem aguenta a tevê ligada 24h na Discovery Kids.

Porém, um trecho da palestra nos interessou. O psicanalista indicava Bach ou Beethoven para ajudar na hora do sono e acalmar a criança. Então resolvemos acatar a sugestão, mesmo com algumas suspeitas. Coloquei Bach para escutarem. A sugestão era clara: som baixo, luz baixa para acalmar as feras.

Decidimos deixá-los sozinhos por meia hora para ver se funcionava. Quando retornamos para o quarto, a cena se repetia. Algo na música deixaram-os ainda mais animados para fazer arte abstrata no berço.

Já cansados de tantas técnicas, especialistas e sugestões da época da vovó. Encontramos finalmente a resposta na (rufem os tambores) fita adesiva dando volta na fralda.




quarta-feira, 5 de agosto de 2015

A história da DR sem fim

Não há desespero maior em saber que mesmo a mais alta das batidas de porta, não deixa realmente para fora o que se sente. Nem a frase mal pensada que você coloca como cereja no bolo pra justificar sua atitude também não funciona como ponto final de conversa. Por que entre você e outro, não há só um relacionamento, existe também uma residência. Assim, não há escapatória para a DR sem fim.
Esse fenômeno demora (ou não) para acontecer, pois num primeiro momento estamos muito felizes por estar morando com o ser amado. O quão empolgante é poder decorar sua casa conforme o gosto de... Bom, neste caso você acabou cedendo ao gosto do parceiro. Mas, e o quão gostoso é poder fazer cineminha em casa vendo aquele filme que...ZzZzz você acabou dormindo porque tinha que acordar cedo no outro dia. Ok, ainda tem a melhor parte: dormir de conchinha, abraçadinhos, aconchegadinhos um no outro, assim como propaganda de colchão que como você deve imaginar se dissipa depois de 20 minutos tentando ficar naquela posição. Por que é claro, você dorme de bruços e ele em posição fetal abraçado com o travesseiro e não com você.
Ainda assim, mesmo depois da água gelada na cara que desfaz o sonho da rotina perfeita, nós conseguimos remanejar a expectativa, até mesmo porque ninguém da conta de ser personagem feliz e bonito de propaganda de manteiga todo dia.
Todavia, o dia-a-dia de um casal dentro de casa, mostra não só como não poderíamos viver num conto de fadas, mas como seu parceiro não é príncipe do seu castelo. Então, às vezes, uma nova faceta aparece (importante frisar que já estava lá), sem avisar, deixando a cama por fazer, fazendo comida na madrugada (deixando a louça pra você), chamando pra conversar sobre o 'Oi' daquela garota no facebook ou pra discutir as contas às 22h, quando a única coisa que você quer na sua vida é o edredom.  E, é num dia desses, em que o diabinho do seu lado te dá todo os motivos que você considera importante para discutir o relacionamento.
No 1° round, alguém acusa, automaticamente o outro se defende. A batalha se estende quase sempre no 'Você isso...." e "Você aquilo...".
Pausa.
2º round: O acusado retorna, agora não mais para defender, mas sim para acusar. Por que assim como cabeça vazia é a casa do diabo, a pausa entre a briga é o momento perfeito pra lembrar daquela toalha molhada na cama da semana passada.
3° round: Existe sempre duas possibilidades para o final de uma briga: alguém cede porque quer ir dormir ou vão dormir brigados.
Pausa.
Quando o fenômeno não acontece perto da hora de dormir, você passa pela prova que é habitar a mesma casa, às vezes até o mesmo cômodo com quem você acabou de brigar. Então, você foi para um quarto tentar se acalmar, ansiando por ficar só, quando o parceiro entra pra pegar sua cueca porque vai tomar banho. Ou, você vai até a cozinha preparar algo para comer e como você não é um ser humano infantil (embora naquele momento gostaria de ser um animal irracional), é claro que oferece o que preparou para o o outro. E entre um desses momentos em que esbarramos com o outro para nos deslocar no mesmo lugar, surge a retomada de conversa.
Lá do chuveiro ele mostra outro ponto da conversa, entre o escovar dos dentes você dá o seu. Colocando seu pijama você se lembra de um exemplo que poderia usar, mas o parceiro diz que quer parar e descansar. Edredom abaixo, tom mais baixo de conversa, pés se tocando, vocês se aconchegando mais, e um dos dois diz bocejando: "Ah mô, você sabia que tava errado né".

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Do amor

Eu calo, você bedelho.
Me abro, você pavão.
Estou nua, você vermelho.
De cabeça, você coração.

Guardo memórias, você as solta.
Penso silêncio, você pensa alto.
Me abro, você se rasga.
Levanto, você de quatro.

Do amor só prezo isso
Sou uma e você outro




quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Sororidade

Nesta semana tive um encontro corriqueiro, porém de abrir os olhos para o que não pode deixar de ser percebido.
Conversava com uma mulher que vai ser avó. Ainda com cara de menina, contou-me que teve seu filho com vinte e poucos anos, e agora ele mais ou menos com a mesma idade iria ser papai. Mas que "tudo bem", ela dizia. Pois ele faz faculdade em outra cidade e pra ele nada vai mudar.
Claro que pensei na hora na futura mamãe, que provavelmente não vai ingressar na faculdade e vai abdicar de outras coisas na vida.
Então voltei-me a para a avó e não consegui parabenizá-la. Afinal, ela me pareceu mais aliviada pela novidade não afetar a vida do seu filho do que feliz.
E o quão desigual é esta ideia de que se numa situação assim, o homem pode seguir com a sua vida e a mulher abdica de tudo só porque teve filho?
Calma, termine de ler antes de começar a me julgar. Sim, faço parte exatamente dessa maioria de novas mamães que por falta de opção ou por opção deixam de lado suas carreiras para poder cuidar de seus filhos. Nada de errado nisso, acredite, todas nós deveríamos ser Amélias por um tempo, chega a ser uma questão de sobrevivência.
Mas voltando ao que dizia, e se essa não for a sua vontade? Por que cargas d'água o homem não pode cuidar do filho em casa para a mulher retomar a vida se assim quiser.
A verdade é que o discurso da futura avó é muito comum. Não chegam a dar outras opções as mulheres, e o mais assustador é que na maioria das vezes isso é feito exatamente pelas próprias mullheres.  Essa mulher de quem escrevo, já tinha calçado os mesmos sapatos e, mesmo assim não se colocou no lugar da nora.
Dentro do contexto histórico é claramente um problema na visão machista que está enraizada entre nós. Mas não busco diminuir ou aumentar o papel do feminismo no século XXI e o problema que ainda existe da desigualdade entres os sexos.
Quero chamar atenção a outro problema, o da falta de amizade entre as mulheres. Não digo amizade de sentar e escovar o cabelo da amiga (e fofocar né), outro ponto machista aí... Mas sim de se colocar no lugar da outra. Assim como no exemplo acima, nos deparamos diariamente com a falta de união entre as moçoilas.
Seja aquele julgamento hipócrita da conduta sexual de outra, um sentimento de vitória porque o namorado de outra te paquerou, a fofoca automática sobre a colega que foi trabalhar sem maquiagem ou a manipulação impecável para que o seu filho faça o que você quer antes da sua nora descobrir.
Para nos entendermos mulheres, precisamos perceber nossos diferentes papeis na vida. Como malabaristas por natureza e uma força imensurável dentro de nós, somos capazes de ver a vida de forma delicada.
Por isso, devemos não só continuarmos nos proteger de velhas ideias, mas também devemos mais empatia uma com as outras.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Para Francisco e Joaquim

No primeiro instante em que vi os seus olhinhos brilhando, uma carinha colada na outra, tão parecidos, tão preciosos, a sala tumultuada com enfermeiras, médicos, instrumentos, desapareceu. Por um momento,  fez-se um silêncio, era só luz e vocês.
Assim começou minha nova vida como mãe. O amor que sinto me dá forças para ser uma leoa quando necessário e uma coruja de asas abertas quando solicitado.
Daqui do meu posto privilegiado, vi suas feições mudarem com o tempo, suas personalidades fortes transbordarem, fazendo com que o parecido se torne diferente.
Sinto que a lição mais importante que me ensinaram sem ainda falar, é apenas sorrir. Sou muito grata pelos sorrisos sem motivo, que me fazem esquecer da bagunça da rotina da vida.
Como é engraçado relembrar nossas apostas erradas.  Vocês nos surpreenderam em cada traço de personalidade. Então, quem parece queto não é, quem agita não faz. Mudando a ideia de que tudo bem não acertar.
Agora confio mais nas suas apostas, nos olhares que conseguem dizer o que querem, e até no choro que demanda o que ainda não têm, porquê confiam que vou entender.
Obrigada Francisco e Joaquim por fazerem da terra um lugar mais leve pra mim.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Coruja suspeita

Olhos cansados de tanto abrir, abro mais uma vez pra um chorinho apertado. Com ouvidos biônicos, escuto tudo do fundo do quarto. Não me escapa nada. Sei onde se esconde a vontade de falar e a de se calar. Aprendi a ser mutável. Sou cantora, dançarina, apresentadora de programa infantil.
Ainda assim, os problemas inventam de existir. Então, prendo-me ao instante, a eternidade é tranquila quando me vejo em seus olhos.
Tudo é dissolvido vendo suas cambalhotas e sorrisos.
Embalo um, embalo dois e com o coração ainda no meio, faço caber onde não tem espaço. 
Esqueço a insistência da noite e faço de mim uma grande coruja de asas abertas.

Ária costumeira

Pássaro que não se acha
Onde desperto sozinha
Sou mais que uma

Entre barulhos variados
Cada quarto com seu som
Som de tudo, som de nada

Vivendo pela ária do ser
Pelo abraço descompromissado
E sobretudo pelo estado de graça

Notas musicais de rotina
Ora minhas, ora suas