terça-feira, 10 de setembro de 2013

Coruja suspeita

Olhos cansados de tanto abrir, abro mais uma vez pra um chorinho apertado. Com ouvidos biônicos, escuto tudo do fundo do quarto. Não me escapa nada. Sei onde se esconde a vontade de falar e a de se calar. Aprendi a ser mutável. Sou cantora, dançarina, apresentadora de programa infantil.
Ainda assim, os problemas inventam de existir. Então, prendo-me ao instante, a eternidade é tranquila quando me vejo em seus olhos.
Tudo é dissolvido vendo suas cambalhotas e sorrisos.
Embalo um, embalo dois e com o coração ainda no meio, faço caber onde não tem espaço. 
Esqueço a insistência da noite e faço de mim uma grande coruja de asas abertas.

Ária costumeira

Pássaro que não se acha
Onde desperto sozinha
Sou mais que uma

Entre barulhos variados
Cada quarto com seu som
Som de tudo, som de nada

Vivendo pela ária do ser
Pelo abraço descompromissado
E sobretudo pelo estado de graça

Notas musicais de rotina
Ora minhas, ora suas





quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Me retiro desse posto

A Guerra (1956), Cândido Portinari


























Do que nos foi deixado
agora vemos de bom agrado
Do que nos foi imposto
agora me tiro desse encosto
Do que nos foi disposto
agora sinto o oposto

Somos opostos dos que mentem
Contraposto dos que sentem
Somos restantes dos que ouvem
Bom gosto dos que se desprendem

(...)






quarta-feira, 29 de maio de 2013

Estórias de Sara

Estava num voo noturno de São Paulo pra casa, numa daquelas madrugadas que você sabe que não vai dormir.
Já estava irritada por não ter conseguido uma poltrona do lado esquerdo, ao lado do corredor. Comprei a passagem de última hora porque meu querido chefe pediu para que eu estivesse no outro dia às 09:00 no escritório, assim só consegui a poltrona do lado da janela.
Imagine você apertada contra a janela fria, com vontade de fazer xixi as 03:00 da matina e tendo    que acordar o coleguinha do lado para poder ir ao banheiro.
É, eu não cheguei com o pé direito quando entrei no avião. Mas, pelo menos, fui uma das primeiras pessoas a chegar, coloquei minha mala de mão primeiro e me acomodei sem maiores problemas. Respirei fundo e pedi a aeromoça uma taça de vinho.
- Senhora, só depois de decolarmos.
Pensei: "Senhora?! Espero não ter um ataque fulminante antes de virar senhora!"
No meio de um plano imaginário de assassinato, um príncipe encantado passa pelo corredor. Meus olhos foram com ele. Sabe como é, muito trabalho e pouco tempo pra sair.
Foi quando ele parou no meio do corredor e começou a conversar com a aeromoça. Quando os dois olharam pra mim, e a aeromoça apontou o dedo em direção a minha poltrona.
Vi ele voltando o corredor em câmera lenta, tinha cabelos escuros e uma boca linda. Segurava um livro que eu conhecia bem a capa, era 'O Morro dos Ventos Uivantes'. Surpresa agradável.
Sentou-se na poltrona e me disse "Oi' sorrindo e exalando um perfume dos anjos. Foi amor à primeira vista.
Assim, o avião começou a decolar. Confesso que ainda sinto borboletas no estômago, mesmo viajando quase todo mês. Imaginei-me segurando a mão dele, passando pelo medo juntos, quando uma pergunta me trouxe à realidade:
- Têm medo de avião?
Ele me perguntou abrindo a conversa mais clichê do mundo, mas também a que poderia vir a ser o começo da história que iríamos contar no nosso casamento.
Respondi que sim, tentando esconder a timidez. Assim começamos a conversar do que fazíamos, pra onde íamos, quem somos e quem queremos ser.
- Então, primeira vez que lê 'O Morro dos Ventos Uivantes'? Perguntei à ele.
Entre risos me respondeu:
-Na verdade, não. Deve ser a quinta vez que leio. Gosto de romances e esse é com certeza um dos mais bonitos que já li.
"Que homem! Meu Heathcliff!" Pensei toda abobalhada e logo pousei meu olhar na sua mão esquerda. Sem aliança, para a minha alegria.
Conversa vai, conversa vem. Ele não citou nome de mulher em todas suas histórias, aparentemente, também sem namorada. E uma vez ou outra, citava o 'Fabinho', devia ser amigo de infância, pois pareciam fazer tudo juntos. Achei bacana, mesmo porquê eu também tinha uma melhor amiga, a Tina.
Contei sobre uma viagem que fizemos juntas para a Inglaterra. E de quando fingíamos ser espanholas que não sabiam falar nada de inglês, para assim despistarmos paqueras de caras estranhos.
Rimos alto. Nós estávamos realmente nos divertindo, meu humor tinha melhorado consideravelmente. Já nos imaginava saindo juntos e apresentando nossos melhores amigos. Quem sabe um casamento duplo? Ria internamente.
Foi quando sem perceber, pousamos no nosso destino. Olhamos um para o outro como se disséssemos "Mas já?!".
Levantamos e começamos a reunir nossos pertences para ir embora, quando ele disse:
- Sara, me dá seu número?
Estava ansiosa por esse pedido. Abri primeiro o sorriso e depois a boca pra falar, quando seu celular tocou.
- Oiii Fabinho, tudo bem sim. Então amor, acabei de chegar. Conheci uma amiga, a Sara, ela é ma-ra-vi-lho-sa. Você vai adorar ela!



terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Estórias de Sara


Já passava das duas horas da madrugada, o bar estava cheio. Rolava uma baladinha hard rock que todo mundo sabe cantar e alguns olhares trocados.

Mas tinha aquele. Um cara que o fulano me apresentou e não tirou os olhos de mim desde então. Pensei em retribuir o olhar, mas quando o fazia, ele fingia não prestar atenção.

Noite adentro, alguns goles a mais e as conversas começaram a ficar nebulosas. Logo o perdi de vista.

Foi quando ele apareceu do meu lado, gaguejando pra me pedir um cigarro.

Eu disse: - Claro!
E tirei um cigarro do maço, esperando deixa-lo mais tranquilo.

Fiz o que toda garota que finge não estar interessada faz: olhei para os lados como se estivesse procurando algo ou alguém. Ele se posicionou na hora. Disse o primeiro chaveco barato que lembrou, mas valeu a tentativa.

- Garotas bonitas não podem ficar com copos vazios.

E pra minha surpresa, encheu meu copo com aquela cerveja que pensei que só eu gostasse.

Meu primeiro pensamento foi: homens e sua mania de nos embebedar. Mas pô, ganhei uma cerveja e ele ta interessado. Tá na hora de parar de ser difícil.

Então abri um sorrisão, agradeci e sentei mais perto dele.

Conversa vai, conversa vem. Já passava pela minha cabeça: quando é que ele vai me beijar?

Foi quando ele pegou na minha mão e disse:

- Queria muito ficar com você hoje, mas a minha namorada ta aqui no bar.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Veneta


Olha pro alto pra averiguar o satélite
Lua cheia ou minguante
Crescente ou descrente
O eixo de 160° cresce consideravelmente
Cresce fios de ânimo, vulgaridade, mas sobretudo de ingenuidade
Sonha com o rapaz que passará lentamente seus dedos por entre os fios sedosos
Mesmo que imaginários, são parte da dança da sedução que procura no céu o seu apoio
E assim como o céu escuro, há dentro dela o ponto forte de iluminação
Ponto em que a veleidade particular do ser transparece
Voltando a dança da noite e buscando acima ser correspondida